quinta-feira, 27 de novembro de 2014

Romance Moderno

   Muito me apaixonei perdidamente em minha vida, e tanto anos quanto minutos todas foram arrasadoras. Certa vez dormi com uma loira quente. Ela em uma janela e eu na outra. Pelo menos eu estava por trás.
   Você pode até não gostar de pegar ônibus, mas convenhamos que esta obrigação de todo dia é um ninho erótico e romântico. Pode até virar um programa diferente para sair da monotonia do cinema. Cadeiras confortáveis no estilo "love-sit" com vista panorâmica das calçadas. passando lentamente no estilo parnasiano misturando os animais e a vegetação bem espessa da ervas daninhas, que sobem a superfície por entre as rachaduras da calçada suplicando um lugar ao sol. O trepidar do motor na marcha lenta somado ao cenário apocalíptico transforma o descanso banal do final do dia em horas de gozo num spa coletivo.
   hoje, eu estava em pé e (acredite se quiser) uma moça se ofereceu para carregar minha mochila. Eu, encantado com tal gesto de maestria, entreguei-lhe cuidadosamente antes que mudasse de ideia. Foi quando a superfície doce de seus dedos entrou em leve contato com os meus. Ela  ríspida arregalou os olhos e me fitou. Eram verdes e invertidos, o da esquerda olhava meu olho direito e o direito o meu olho esquerdo. O tempo parou, o funk do fundo do ônibus ficou surdo. Conversamos e a levei para casa. Porém, como qualquer "felizes para sempre" dos dias atuais, durou apenas uma noite.Na manhã seguinte ao ver que eu não havia feito café desse-me que eu não fazia o "tipo" dela e que tinha mudado.
   -Não é você sou eu! Adeus.
   Mas tudo bem, o meu salário não vai aumentar, vou pegar ônibus amanhã de novo. Vai que dou sorte dessa vez?

quarta-feira, 26 de novembro de 2014

A Grande Surpresa

   Sem muita opção ela foi. Contrariada e insegura entrou no carro, onde a colocaram vendas para caso se arrependesse. Tudo escuro sentiu aroma de pão fresco e em seguida grama verde. Sabia até aí o lugar por onde tinha passado, afinal aquela parte da cidade conhecia bem. Entretanto entrou em uma rua esburacada a qual não se lembrava bem, sentia cheiro de poeira agora e o tempo não passava.
   O carro para. Após ser guiada por cômodos grades conseguiu sentir o frio do azulejo da parede.
   Pobre menina, inocente acreditou no namorado. Onde estaria ele em uma hora dessas? que cidade? Ela se torturava pensando nisso aquela hora.
    Exatamente um mês antes viviam a perfeição de um amor adolescente. O rapaz também muito apaixonado mergulhava na liberdade e privacidade a qual tinham no dia-a-dia. Ambos foram apresentados à camisinha na escola, e conseguiram passar nas provas. Entretanto no momento crucial, na instância eufórica da tal noite, ele fez a promessa. Foi a penúltima. Sabendo do resultado do exame ele fez a última, mas não cumpriu nem uma nem outra.
   A mau dita pílula. O professor disse das chances de falha, e não deu outra. Cogitou a possibilidade de criar a criança, mas ele já tinha sumido. Então conversou com a prima. Ouvira falar que já tinha feito e tinha dado certo. Pensou que talvez não fosse tão ruim assim, talvez ela tiraria aquele problema de dentro do seu útero e voltaria a vida normal. Afinal tinha dado certo com a prima, não é mesmo?
   Se enganou, como eu. Pensei que essa história poderia ter acabado diferente, a crônica tem essa exigência da grande surpresa. Gostaria de saber como surpreender você leitor. Porém, quem se surpreende com tudo isso sou eu. Depois de tanto pensar não consegui fazer com que ela tivesse o devido atendimento, pois me corta o coração escrever ficção.

terça-feira, 18 de novembro de 2014

Interesses.

   Espalhafatosa e de olhos exageradamente delineados, entra a perua do hall da pequena capela de São Leonardo, disparando palavras ao padre.
   -Você é o dono dessa espelunca aqui?
   -Hein?
   -Me desculpe a honestidade, é que não sou de mentir. Sabia que é pecado?
   -...!
   -Enfim. Eu vim aqui resolver de forma adulta o drama que tenho vivido.- olha para o altar atrás do de Jesus- Nossa! Olha aquela estátua, do bofe morto. De frente pra porta é mau feng-shui...
   -Senhora! mais respeito na casa de Deus!
   -É ele então o culpado.
   -Quê?
   -Ele!
   -Quem?
   -Deus!
   -Hã?
   -Sim.
   Como um sinal de trânsito, o rosto do padre foi aquecendo enquanto ela continuava.
   -Seis da noite e me aparece esse tal Deus fazendo a maior algazarra. Não sei como funcionam as coisas aqui nesse fim de mundo mas em Parrí não existia isto, não. Vai contra o meu sono da tarde. Além do mais, meu marido é dono de metade (disso) daqui, acho que como primeira dama desta cidade, tenho direito a um mínimo de respeito.
   -Mas dona, não se pode mudar o horário da nossa oração. isto seria como rê-escrever a Gênese! não seja ridícula.
   -Seu padre... a situação é a seguinte: eu tenho o poder que controla o instinto do coronel, que é quem abafa os seus segredos. Acho que Deus não gostaria nadinha de saber da sua cara-de-pau padre. Ele pode até te demitir, eu acho.
   -sete horas está bom?
   -7:30 e não se fala mais nisso.
   -Okay. Gostaria de uma taça de vinho, madame?

segunda-feira, 17 de novembro de 2014

Fuja para a Angola!

   O emissário chega com a resposta do pedido de sessar fogo:
   -Dáá dé bléshin blé blé blé glubn glubn.
   Um silêncio se faz dentro do Chiqueirinho Central, o qual já dava sinais de desmoronamento. Ao ouvir tal mensagem o general deixa caír sua chupea que rola até os pés de um soldado que subitamente entrega-se aos prantos chamando a mamãe.O chefe da operação solta grunindo típicos grunidos típicos de bebês que traduzindo significaria "Não quero mais brincar".
   Porém, entre o caos e a choradeira nosso protagonista se destaca. Ele usa um macacão azul camuflado e uma mamadeira quebrada. Tem resto de leite seco no canto da boca, que dá um tom de perigo aos olhos azuis.
   Sem gaguejar cala tudo e todos. Começou como uma neblina tomando forma lentamente, mas rápidamente explodiu em gritos de confiança. Enfatiza  a fraternidade: "GLUEFB!", a força e a coragem de cada um: "BLABA, BLABESH!", todos os companheiros que pagaram com a vida: "SLEPB"!
   Verdade seja dita, para quem olha bebês gritando perante a um discurso bebeístico a situação era mais cômica do que inspiradora. Mas para aqueles míseros soldados, ter alguém que consiga transformar o sentimento de injustiça e indignação desta minoria em palavras (ou quase isso), era o que eles precisavam ouvir. E como sabemos do ser humano, muito mais do que verdades, ele quer ouvir o que pensa. Imagino eu eu ser algum tipo de falta de confiança ou medo.
   Em meio a euforia ele diz "GLUBM BLISTOS DÁ GUGÚ!". Meio contrariados, mas ainda confiantes, os soldados armados com suas mamadeiras engatinham enérgicos para o "front" de batalha. Isto que é Oriente Médio, porque se fosse BR já seria desertor na Angola começando vida nova.
   Muita gente interpreta isto como falta de patriotismo e negatividade, eu vejo como a nossa maior prova de intelectialidade e conseiência.

sexta-feira, 14 de novembro de 2014

Pane no Sistema (P.S.: Socorro!)

   A porta se abre como um tapa e revela um homem de jaleco e óculos quadriculado que berra:
   -Doutor! Doutor! Puxaram a alavanca!
   -Que alavanca?
   -A da paixão.
   -A DA PAIXÃO?!
   -SIM! A DA PAIXÃO!
   Voam os dois pelos corredores brancos até chegarem na parte administrativa. Perguntam à Secretária o paradeiro do chefe do Setor de Pensamentos Racionais (SPR).
   -Sinto muito senhor, mas ele acabou de pedir afastamento. Justificou por motivos de força maior.
   -Você não entende a gravidade da situação -diz o Doutor- é um código vermelho!
   -Vermelho? sim...(tecla, tecla) -com um sorriso sem graça a moça pergunta- você está muito bonito hoje Doutor, vai fazer alguma coisa depois do serviço?
   O Estagiário e o Doutor se olham.
   -Já está fazendo efeito. Rapaz, vá a minha sala e pegue os mapas e a chave para a sala das incertezas.
   -Mas a sala das incertezas? tem certeza?
   -É a única maneira de ter certeza é certificando-se da certeza do amor -tapa na boca- corre rapaz...
   O chão treme pelos pulsos descompaçados, mas ligeiros do coração. Ouve-se boatos que há borboletas na barriga e um nó na garganta. O Setor de Comunicação Oral (SCO) declarou estado de emergência. O Setor do Senso de Ridículo (SSR) está em greve e exige condições melhores de trabalho.
   -Aqui está Doutor. Doutor?
   No meio de um amasso caloroso com a Secretária encontra-se o Doutor.
   -Opa! Oi! Então (risos) trouxe o que eu pedi?
   -Sim, a chave e os mapas.
   -Rasgue os mapas e jogue a chave fora.
   -MAS DOUTOR!
   -Sem mais nem meio mais, faça isto e volte aqui depois.
   -Voltar?
   -Tem alguém que eu quero que conheças.
   -Quem?
   -Uma amiga dela -sinaliza com a cabeça pra Secretária- do Setor de Sobrevivência da Espécie (SSE) se é que você me entende.

Louca Sanidade

   Imagine Napoleão. Eu. Como tal devo ser respeitado. Banquetes coloridos eram meus coquetéis. Tenho mesa farta e bons amigos para festejar. Mas não hoje. Hoje estou de ressaca. Estes deveres de todo dia me cansam e atrevo-me a abrir um chileno 96 (ótima safra).
   O ar quente e abafado leva às minhas narinas um cheiro doce e gorduroso, e com tamanha minha fome mastigo sonolento. Garfadas fartas aproximam a veracidade neste parágrafo.
   Gosto de marchar diante de maus súditos, falar-lhes coisas apaziguadoras. Só não entendo por quê me olham torto. Será que me acham maluco? Audácia destes camponeses, depois de tudo que fiz por eles! Nada! Eles também sempre me fizeram nada e nem por isso esqueci deles. *ic*!
   Como se já não bastassem as traições, agora não temos mais dinheiro. A cidade ferve em rebeliões e me olham com pena e nojo. Meus inimigos sentam-se junto à mesa comigo todos os dias, dentro de taças ou garrafas recicladas. *ic*!
   Tento achar em sentido à vida fora desta cachaça barata, mas me deparo com um cheiro amadeirado e azedo de exclusão social. Não fui a escola, não fui educado, não tive amores, nunca recebi um presente. Entretanto já fui preso, já fui louco, comi do lixo e já apanhei para diversão de terceiros.
   Fugi. Agora sou Napoleão e vivo nos becos desta cidade acompanhado da única coisa que não me abandonou. O Vício.

Segunda e a canonização da chatice.

   Mal dito seja Djavan -um dia frio, um bom lugar pra ler um livro. Nada me frustra mais do que lembrar desta música em plena segunda-feira, OH DIAZINHO MAIS OU MENOS! Pra piorar, ainda tem a praga da minha vizinha de mesa, que consegue acordar sorrindo em contraste à catástrofe (HOJE). Nada me irrita mais que gente feliz.
   O único bom da segunda é jogar na cara dos outros o que eu fiz no final de semana, ou o que eu me lembro (RISOS). Tirando semana passada, que a enjoada da Jerusa contou sobre a viagem sem graça dela pra Bélgica. Odeio gente convencida.
   Juro que rezo todos os dias para o Santo da Sexta-feira -que me livre e guarde da chatice da Jerusa- essa mulher pediu pra ser chata e o próprio Deus canonizou-a como A Santa da Chatice.
   Mas graças a ele (Deus) eu tenho minha casinha. Meu refúgio. Chego em casa tarde, fico descalça, pulo no sofá e pego o meu lap (um momento de mim comigo, sem ninguém julgando) e entro no face pra ver o que meus amigos estão fazendo.
   Porém sempre tem a Jerusa pra estragar até isto. Vem ela postando vinhos e queijos da noite #vinho #queijo #comamor #goodvibes #suaridícula... Ups! Comentei.
   Finalmente vou dormir. E como se não bastasse além do dia todo aturando essa carrapata podre, ela me aparece a mente quando me deito. Culpa dela não estarmos juntas ainda hoje. Saudades. Só me falava sonhar com ela de novo.